sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Ave Palavra - Exemplares de textos admiráveis

Crônica de Nelson Rodrigues, intitulada "A frase", publicada no jornal O Globo, em 5/7/1968, e reproduzida no livro A cabra vadia - Novas confissões (Editora Agir, 2007):



Ah, o brasileiro mata e morre por uma frase. Nunca me esqueço de uma crônica dominical do Carlinhos de Oliveira. Terminava assim: - "A solidão do homem é um problema político." Era a chave de ouro. Antigamente, os poetas não a dispensavam. Soneto sem "chave de ouro" morria ao nascer e, repito, morria antes da primeira chupeta. Carlinhos não faz sonetos e, se os faz, não os publica. Mas é um parnasiano. E usa, nas suas crônicas, a perfeita, irretocável chave de ouro.

A mim interessa, e muito, o destino das frases. - "A solidão dos homens é um problema político." Saiu no domingo; e já no dia seguinte, segunda, alguém me perguntava: - "O que é que o Carlinhos quis dizer com isso?" Há um velho e obtuso preconceito, segundo o qual todas as frases querem dizer alguma coisa. Nem sempre. No caso do Carlinhos, nem ele nem a frase querem dizer rigorosamente nada.

E foi por isso que Carlinhos a fez, e foi por isso que Carlinhos a publicou. Mas certas frases vivem, precisamente, de mistério e de suspense. A nitidez seria fatal. "A solidão dos homens é um problema político.". Na pior das hipóteses, há uma melodia e o resultado auditivo basta. Mas entendo o drama do cronista. Os melhores autores têm suas três ou quatro frases encalhadas. É preciso aplicá-las. Mas onde e quando? O ideal seria que o Dr. Brito (José Nascimento Brito, diretor proprietário do Jornal do Brasil) pagasse e publicasse, no espaço da crônica, uma única e escassa frase. Ma tal não acontece.

O autor traz, no ventre, um romance. E quando trabalhávamos ambos com os Blochs (donos de publicações cariocas, como a extinta revvista Manchete) , o Carlinhos fez insinuações sobre uma "obra cicóplica" que

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